sexta-feira, julho 30, 2004

Resgate Circulo - Projeto textos longos para o fim-de-semana:
Mais um texto do extinto Circulo

Sermões Para Hoje

O que qualquer professor meia-boca de literatura sabe: Padre Antônio Vieira, ao lado de Gregório de Matos representam o barroco dentro da literatura brasileira no século XVII. Gregório com seus poemas críticos/ satíricos/ eróticos /sacros /amorosos e Antônio Vieira com seus sermões.

Esses sermões representam o estilo barroco ao demonstrarem dois opostos, não apresentarem muitas soluções e pela retórica cíclica e redundante. Vieira pertencia a Companhia de Jesus, e logo, não apresentava antagonismos entre carne e espírito do mesmo estilo que Gregório de Matos.

O que professores de literatura deveriam saber: Vieira apresentava argumentos que buscavam defender a unidade e a soberania da nação portuguesa. Preocupava-se com os rumos que a colônia tomava e com sua sub-utilização, com a manutenção da monarquia lusitana.

Vieira tinha preocupações bem além das almas a serem salvas. Preocupava-se com o inevitável avanço do mercantilismo e como preservar Portugal. Mais que preservar, inserir a nação nesse contexto.

Seus sermões dirigidos aos nobres e aos regentes exprimiam idéias como pecado por conseqüência (atos têm conseqüências e ao realizar um ato você é responsável por todos os seus desdobramentos, como no voto) e por omissão (que ao deixar de fazer algo, você tem culpa por todo o desencadear de não produção que aquilo causa, como decretar leis). Oferecendo, claro, o fogo do inferno para os pecadores.

Também critica a isenção tributária de clero e fidalguia. Diz ele: “Sobre os ofícios, sobre os que menos podem, caem de ordinário os tributos; não sei se por lei, se por infelicidade, e melhor é não saber por quê” - Sermão de Santo Antônio, de 1642.

Sabendo que Vieira era um nacionalista, essa sua preocupação com o povo ou “terceiro estado” (termo que algumas vezes utilizava) na verdade é uma preocupação com os cofres lusitanos.

É óbvio que o povo é muito menos provido de bens e muito mais suscetível a uma revolta que a fidalguia. Vieira chegava a dizer que a coroa roubava a si mesma. Essa isenção causava um desabastecimento dos cofres reais que se refletia na fragilidade econômica da nação.

Passados séculos, ainda temos problemas similares na mesma colônia. Embora agora não tenhamos mais o nome de colônia, estampemos uma bandeira nossa e cantemos hino próprio, ainda dependemos.

Mais que depender, os dirigentes (ex-fidalguia) continuam não pagando impostos e enfraquecendo os cofres nacionais. A isenção não é um decreto real, porém facilmente obtida.

A impunidade tem o mesmo valor que um decreto. Uma lei que determina uma atitude e uma conseqüência da sua má aplicação.
São muitos os que sonegam impostos e são poucos os punidos. E nem me preocupo aqui com o desvio de verbas. Todos os sonegadores têm ótimos recursos para ignorar as leis. Como advogados “recurseiros” e os contatos “certos”.

Todas as tentativas de sobretaxação por ganhos maiores são rapidamente derrubadas nas casas da democracia. Votam todos aqueles que interesse em negá-la. Ou seus amigos, parentes, compadres, etc.

Percebe-se a prática do pecado da omissão. Não são raras a sessões encerradas por falta de corum. Condenam-se ao fogo eterno todos.

Mantemos os cofres da nação vazios e problemas de rombo orçamentário.

Pecam esses homens por omissão. E pela sua omissão, omite-se saúde, alimentação, emprego, higiene, educação. E quantos mais pecados podem essas omissões todas gerar?

Vieira pensava na estabilidade da nação lusitana. Eu e todos os que reclamam pensam no processo de desumano da negação imposta a partir do ato “mau”. Mas como esses que pecam por omissão estão nessa posição de decisão?

Pela “expressão de nossa cidadania” dentro do processo democrático.

Pecam por conseqüência, todos que votam neles e sentem-se livres de qualquer outra obrigação. Essas pessoas serão condenadas por conseqüência. Cada ato daquele que recebeu seu voto também é ato seu. Cada pecado dele é seu. De acordo com Vieira, queimaremos todos.

Pelas conseqüências àqueles que outorgamos poder e por omissão por nada fazer enquanto eles nos condenam à danação.

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